Eram famílias inteiras, das
aldeias vizinhas do rio,
as que, findas as colheitas dos
cereais, tinham brio
em ir lavar as roupas de linho e
do enxoval
aos poços do rio, com mais
baixios e fino areal.
E quando iam para lá, levavam
animais
domésticos, alguns víveres, e
tudo o mais
que, em circunstâncias tais, a
ausência exigia.
E, cantando e
rindo, davam largas à sua alegria.
Depois, chegados às margens
acolhedoras do rio,
debaixo de árvores frondosas,
instalavam o acampamento
rudimentar, em desalinho, com
trapos e mantas de lã.
Onde dormiam pais e filhos, de
pés e cabeças virados
uns para os outros, desde o
anoitecer até ao clarear da manhã.
Aquilo, para os mais jovens, eram
ocasiões de pura magia:
dormirem ao relento junto dos
pais, alegres e brincalhões,
que lhe contavam histórias do
rio, como se fossem seus guardiões.
E pela manhã,
quando o sol aquecia as águas calmas do rio,
iam com eles nadar,
enquanto as mães lavavam o linho
e os enxovais
das filhas casadoiras, e os peixinhos, como na lenda,
lhes mordiscavam
as pernas submersas na corrente do rio,
que ia ao
encontro do Douro, levando consigo segredos de amor,
que os lençóis
confiavam ao mui nobre e leal rio Sabor.
Depois, ao
cair da tarde, quando o astro-rei apontava ao Ocaso,
as lavadeiras
acendiam a fornalha e colocavam as caldeiras
de cobre em
cima de trempes, quais alquimistas verdadeiras,
para mergulharem
as roupas manchadas nas cinzas ferventes,
para serem
novamente ensaboadas e postas a corar, nas correntes
do relento da
noite, e a secar ao sol doirado da manhã seguinte,
até ficarem
alvas e depuradas, cheias de requinte.
E era assim
que passavam os dias e as noites, as lavadeiras do Sabor.
Purificando
sorrisos e lágrimas, vertidas em actos de pranto ou de amor,
impregnados
nos lençóis de linho. Fruto do trabalho e do suor
com que os
lavradores preparam os campos dos linhais,
nas terras
fecundas das aldeias de Lagoa, de Talhas e de Morais.
E findas as
tarefas, despediam-se do rio e regressavam ao lar.
Com a certeza
que no ano seguinte, se os deuses do Sabor
o permitissem,
lá iam voltar, com o mesmo carinho e amor,
para lavarem
outros sorrisos e outros lençóis de linho,
manchados em
actos ternos do amor fraternal e divino.
(Publicado no Livro: "Homenagem ao Rio Sabor" - Tartaruga Editora)
Dia 5 de Junho - Dia Mundial do Ambiente