quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

O Poema que não quero escrever…




Se alguém ousasse escrever um poema,
Com palavras nunca ditas nem inventadas,
O que diria nesse poema?
Não sei. Nunca ninguém o escreveu,
Nem a tal se atreveu…

É verdade que nasce luz da utopia,
Mas eu pergunto o que se diria,
Num poema assim escrito.
Sim, que mensagens e sentimentos,
Que pensamentos e alegorias teria,
Um poema sem imagens nem poesia?

Não sei. Eu não quero usar palavras
Sem carácter e sem mensagem e harmonia,
Para escrever um poema sem amor,
E sem beleza e fantasia...

Porque um poema só é poema,
Quando é escrito com amor,
Com raiva, e com alguma utopia.
Porque só assim é mais verdadeiro,
Só assim tem mais poesia.


In Livro “Memórias e Divagações” – Poética Editora

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

A água é da Humanidade


Se eu não fosse temente a Deus,
Perguntava-Lhe, humildemente:
Senhor, porque são os filhos teus,
E sempre os mais pobres e aflitos,
A pagarem benesses aos ricos?

Sim, perguntar-Lhe-ia eu:
Porque são sempre esses,
A pagar a tanto figurão,
Cercado de mordomias,
Que vive do alheio, os seus dias,
Sem haver para isso uma razão?

Penso nisto, Senhor,
Do fundo do meu coração,
E creio que não esteja bem!
Porque há os que não têm o coração no peito,
Mas sim na palma da mão,
Onde lhes dá mais jeito…

E a minha mágoa aumenta de dureza,
Quando um Elemento da Natureza,
Como é a água, possa ser oferecido,
Sem razão nem sentido, a cidadãos
Que juram que ela, em suas mãos,
Vai ser tratada e distribuída com equidade,
Na plenitude da liberdade! 

E dizem mais, esses malabaristas:
Dizem que os surfistas
Terão sempre as ondas do mar,
Para surfar.
E que nos campos golfistas,
Não faltará, também,
A água dos lençóis freáticos,
Guardada no ventre da Terra-Mãe,
Há milhões de anos,
Para poderem praticar o golfe,
Com engenho e arte, sem enganos...

Enquanto dizem ao povo humilde,
Que a chuva é, de facto, uma dádiva de Deus,
Mas que não tenham receio de ficar sem água,
Porque eles tomarão as medidas necessárias,
Normais e extraordinárias,
Gastando os seus dinheiros,
Com sábios técnicos e engenheiros,
Para que a água não falte no mar,
Nem nos rios, nem nos ribeiros...

Tão poluídos que estão eles e o ar,
Coisa que não querem que aconteça.
E, por isso, a água deve ser sua pertença,
Porque são eles que a sabem cuidar.

Ora, Senhor, isto custa-me a suportar,
Sem que se apodere de mim uma revolta, sem fim,
Que me faz desesperar.
Ao ver tamanha desfaçatez,
Que me provoca, por sua vez,
Uma mágoa que não passa.
Porque a água, Senhor,
Dá-La Tu, a eles e a todos nós, de graça.
E, por isso, deve ser de toda a Humanidade!

E por todos repartida,
Com amor e equidade.
Porque sem água não há vida,
E sem vida não há Humanidade!

Mas, Senhor,
Fazer compreender isto ao agiota que passa,
Só com a Tua divina graça.
Porque ele quer tudo,
Sem se importar com a desgraça,
Dos desprotegidos da raça humana.

E pior que tudo isto, Senhor,
É ele pensar que até a Ti engana!...

In: Livro "O acordar das emoções" - Tartaruga Editora        



22 de Março – Dia Mundial da Água

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Apelo (a um cientista nuclear)



Homem do saber,
Lembra-te que hoje ainda não é tarde,
Mas amanhã já pode ser.

E cada vez mais finito.
Por isso, pára e observa a natureza,
E verás como o azul do céu é bonito!

Então, deixa o átomo em paz, e vê:
Homens, mulheres e crianças a sofrer.
Grávidas com o seu ser doente,
Flores e plantas a morrer. 

Até o ar,
Que não e teu,
Vais ferir de morte.
E os rios e as florestas terão igual sorte!

Tudo ficará cativo, sem nada poder fazer,
Se não fizeres bem o teu dever:
Deixar o Mundo viver em Paz,
E dares outro destino ao teu saber.

E só assim,
Em nome dos vindouros,
Todos te poderemos agradecer!

           Abril de 1985
        (dos jornais: experiência nuclear feita em segredo)

       In Livro: "O Clamor dos Campos" - Edições Colibri.

sábado, 13 de janeiro de 2018

O Medo




Confesso, Senhor, o meu receio,
Que sinto em certos momentos,
E me angustia e mete medo,
Aos sentidos e pensamentos.

O homem quererá ser louco,
Perder o amor que tem?
O que imagina não é pouco,
Ao meter-se na Obra do Além!

Construir um “homenzinho”
Num laboratório qualquer,
Sem sentimentos nem medo,
Fóra do ventre da mulher?

Ao capricho do seu querer,
Qualquer cor sem coração?
Sem ser homem ou mulher,
Que nunca dirá que não?

Sem ser Teu semelhante,
Não terá alma, nem sentimentos,
Nem medo, nem carinho ou amor,
Nem seja lá o que for!

São disto os meus receios,
Que em silêncio vejo passar.
E a minha ignorância pergunta:
Que quer o homem provar?

Que salva a humanidade?
E não a irá aniquilar?
Mas na minha fé espero
Que Tu não irás deixar.

        Lisboa/Maio de 1989 

     In Livro "O Clamor dos Campos" - Edições Colibri