Bem cedo aprendi,
Que o trabalho dignifica,
Todo aquele que o pratica,
Sem querer o proveito só para
si.
Mas que, pelo contrário,
Partilha a sua arte e saber,
Com todos os que o acompanham:
Seja o engenheiro,
Traçando projectos no papel;
Seja o operário,
Vergando o ferro para construir uma
“Torre de Babel”...;
Seja o doutor,
Transpirando para aplacar a dor ao
paciente;
Seja o cavador,
Cavando a terra e cobrindo a
semente;
Seja a dona de casa,
Limpando o pó que entra pela
janela;
Seja a parteira,
Segurando uma criança alheia,
como se fosse dela;
Seja o ferreiro,
Temperando o ferro com um chifre
de carneiro;
Seja o arquitecto,
A imaginar o mundo debaixo de um
tecto...;
Seja o moleiro,
A picar a mó alveira com um toque certeiro;
Seja a tecelã,
Urdindo teias de linho e de
lã;
Seja o sapateiro,
A imaginar fazer sapatos
para calçar o mundo inteiro;
Seja o jardineiro,
A tratar de flores o dia
inteiro;
Seja o compositor,
A compor a música de um poema de
amor.
Enfim, seja ele quem for,
Desde que trabalhe com a firme
ideia,
De que não come o suor da mão
alheia!
Porque todos devem saber,
Que o trabalho em cadeia,
Vence a “fera” que o
rodeia.
Por que esta, qual camaleão,
Espera sempre pela ocasião,
De se apoderar do rendimento do
trabalho.
Seja ele intelectual, doméstico,
científico ou braçal,
Que faz avançar o mundo real.
E que tem início no trabalho
de parto das mães,
Para trazerem ao mundo, que
não querem imundo,
As crianças que são a coisa
primordial,
Que faz mover o mundo real.
Mundo onde devem crescer e
brincar,
Livres da escravidão de quem as
quer utilizar.
Seja no Bangladesh, na Índia, na
África, ou no Paquistão...
Para manufacturarem objectos de
marca, de duvidosa criação,
Exibidos por “simpáticos”
americanos, asiáticos e europeus,
Como sendo trabalhos seus,
Em “passerelles”, da moda
circular,
Onde desfilam jovens que lembram
anoréticos,
Com movimentos ensaiados e
moldados,
Bambaleando seus corpos, frágeis e
esqueléticos,
Num bailado de sedução,
Na presença de senhores
que lá estão a aplaudi-los,
Para depois os impingirem à
sociedade
Do consumo, da opulência e da servidão.
Onde se movem quantos se
alimentam, até à saciedade,
Do suor de quem trabalha para
comer o pão.
Sem se darem ao cuidado de
pensar,
No quão gratificante é trabalhar
nos campos,
Onde se criam os alimentos com
que se vão banquetear.
Nem se lembrarem dos que
labutam no mar,
Em noites sem sono e sem luar,
Para trazerem para terra o
sustento de novos e anciãos,
Que os esperam nas aldeias e nas
cidades.
Que homens construíram, com
pedras da lua,
E diligentes canteiros
esculpiram, para enfeitar a rua
Onde nasceram os seus
antepassados.
Que se finaram, velhos e
cansados, de tanto labutarem,
Para exemplo dos vindouros, que
os recordam com emoção,
Porque lhes ensinaram a amar o
trabalho, o criador e a criação!
Esta trilogia tão gratificante,
Para os que procuram viver sem
explorar o seu semelhante.
Como faz o ceifeiro, quando
ceifa o pão
Que o lavrador semeou, em solos
pobres e de aluvião,
Onde germinam frutos e sementes,
De árvores com sombras dolentes,
Que oferecem ao viandante dos
caminhos,
Quando descansa junto à fonte, cheia
de pergaminhos,
Construída pelo humilde
pedreiro,
Que não teve em mente o
"deus dinheiro".
In: Livro "Memórias e Divagações" - Poética Edições
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