Lá em casa todos tínhamos
nome,
Excepto o gato.
Esse era o gato, ou,
quanto muito, o miau.
E como bom felino que era,
Não tinha cara de mau,
não,
Embora se julgasse o
patrão...
A ronronar, junto da
lareira,
Se alguém o pisava,
Virava as unhas e
arranhava...
Ou então,
Se eu lhe mostrava o
sapato,
E lhe dizia: sape gato,
seu mandrião!
Ele corria para a gateira,
E ia para o palheiro,
A murar ratos, o dia
inteiro.
Mas, valha a verdade,
Despesa também não dava.
Comer, só os ratos que caçava.
E ir ao veterinário?
Bom, como assim,
Se não havia médico para
mim!
Já o meu cão, esse era
outra loiça!
Era um perdigueiro, de
dois narizes,
E íamos os dois à caça
das perdizes...
E se por descuido eu o
pisava,
Ele queixava-se, com a
dor,
E triste olhava para mim,
e assim ficava...
Até que eu, com carinho e
amor,
Lhe fazia uma festa na
cabeça,
E ele abanava o rabo de
contente,
Ainda por cima,
E continuava a nossa
estima...
Fomos, muitas vezes,
cúmplices,
Quando íamos no encalço
das perdizes.
Ele, com o vento nos
narizes,
Sabia melhor do que eu
onde elas estavam!
E disso, dava-me sinal:
Cabeça prá frente, bem
esticada,
Pata no ar, levantada,
Nem tossia nem mugia.
Ficava tal e qual,
Até que eu lhe dizia:
Vai lá, Nero...
Então ele dava a esticada,
A perdiz levantava,
E, algumas vezes, caía...
E quando a perdiz caía,
Como ma entregava
contente!
Então eu recebia-a,
Cuspia-lhe no nariz,
Fazia-lhe festas na
cabeça,
E ele abanava o rabo,
E assim agradecia...
Finou-se com a idade, o
meu Nero.
E no dia que ele morreu,
Primeiro chorou ele,
E
depois chorei eu.
In livro “ Memórias e
Divagações” – Tartaruga Editora.
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