quarta-feira, 30 de abril de 2014

Ode ao trabalho e a quem trabalha



  
Muito cedo aprendi,
Que o trabalho dignifica,
Todo aquele que o pratica,
Sem querer o proveito só para si.

E que, pelo contrário,
Partilha a sua arte e saber,
Com todos os que o acompanham:
Seja o engenheiro,
Traçando projectos no papel;
Seja o operário,
Vergando o ferro para construir a "Torre de Babel”;
Seja o doutor,
Transpirando para aplacar a dor ao paciente;
Seja o cavador,
Cavando a terra e cobrindo a semente;
Seja a dona de casa,
Limpando o pó que entra pela janela;
Seja a parteira,
Segurando uma criança alheia, como se fosse dela;
Seja o ferreiro,
Temperando o ferro com o chifre do carneiro;
Seja o arquitecto,
A imaginar o mundo sob um tecto...;
Seja o moleiro,
A picar a mó alveira, com um toque certeiro;
Seja a tecelã,
Urdindo as teias de linho e de lã;
Seja o sapateiro,
A imaginar sapatos para calçar o mundo inteiro;
Seja o jardineiro,
A tratar do jardim o dia inteiro;
Seja o compositor,
A compor a música de um poema de amor...

Enfim, seja ele quem for.
Desde que trabalhe com a firme ideia,
De que não come o suor da mão alheia!

Porque todos devem saber,
Que o trabalho, em cadeia,
Vence o “fera” que o rodeia.
Porque esta, qual camaleão,
Espera sempre a ocasião 
De se apoderar do rendimento do trabalho.
Seja intelectual, doméstico, científico ou braçal,
Que faz avançar o mundo real.
E que tem inicio no trabalho de parto das mães,
Para trazerem ao mundo, que não querem imundo,
As crianças que são a coisa primordial,
Que faz mover o mundo real.

Mundo onde devem crescer e brincar,
Livres da escravidão de quem as quer utilizar.
Seja no Bangladeche, na Índia, em África ou no Paquistão...,
Para manufacturarem objectos de marca, de duvidosa criação,
Exibidos por “simpáticos” americanos e europeus,
Como sendo trabalhos seus,
Em “passerelles”, da moda circular,
Onde desfilam jovens, a lembrar anoréticos,
Com movimentos ensaiados e moldados,
Bambaleando os corpos, frágeis e esqueléticos,
Num bailado de sedução.
Na presença de “senhores” que lá estão a aplaudi-los,
Para depois os impingirem à sociedade
De consumo, da opulência e da servidão,
Onde se movem os que se alimentam, até à saciedade,
Do suor de quem trabalha para comer o pão.

Sem se darem ao cuidado de pensar,
No quão gratificante é trabalhar nos campos.
Onde se criam os alimentos com que se vão banquetear…

Nem se lembrarem dos que labutam no mar,
Em noites sem sono e sem luar,
Para trazerem para terra o sustento de novos e anciãos,
Que os esperam nas aldeias e nas cidades,
Que homens construíram, com pedras da lua,
E diligentes canteiros esculpiram, para enfeitar a rua
Onde nasceram os seus antepassados.
Que se finaram velhos e cansados, de tanto labutar,
Para exemplo dos vindouros que os recordam com emoção,
Porque lhes ensinaram a amar o trabalho, o criador e a criação!

Esta trilogia tão gratificante,
Para os que procuram viver,
Sem explorar o seu semelhante.

Como faz o ceifeiro ao ceifar o pão
Que o lavrador semeou, em solos pobres e de aluvião,
Onde germinam frutos e sementes,
E crescem árvores frondosas, de sombras dolentes,
Para oferecerem ao viandante dos caminhos,
Quando descansa junto à fonte, cheia de pergaminhos,
Que construíu o humilde pedreiro,
Que não teve só em mente “o poderoso deus dinheiro”.


(A publicar em 2014, no meu próximo livro de poesia)



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