A horta, regada que dava gosto.
O cavalo, refeito no lameiro.
No céu, lua cheia, luar de Agosto.
À porta, sentados tu e eu ao paleio.
A Lua convidava à sua
história.
Noite quente, céu aluarado.
A paz absoluta, o sossego na alma.
Em baixo, o Sabor adormecia calado.
Na nória, o som das últimas gotas
De água a cair.
Ao lado, o grilo cantava.
E na ponta da língua, uma pergunta a sair:
- Avô, porquê agora parece dia,
e em cima de nós a lua é redondinha?
- Foi Deus, meu filho. Que Ele seja louvado.
- E aquilo, no meio dela, é uma árvore?
- Não. É um homem, que por não ir
à missa
está lá condenado.
- O que é um homem condenado, avô?
E não tem pernas nem braços?
- Um homem condenado, meu filho,
é aquele desgraçado.
- Mas se ele de lá sair, e for à missa, dás-lhe de comer?
- Não é capaz de sair.
Só sai quando o mundo morrer.
- E quando morre o mundo, avô?
- Quando ele acabar o seu degredo.
- O que é o degredo, avô. Fazes ideia?
- O degredo, meu filho, é o homem ter medo,
Inveja e preguiça.
- Avô, o homem da Lua tem uma candeia?
- Olha meu filho, ele é velhinho de barbas brancas...
- Avô, vamos dormir.
Leva-me à missa,
Eu não quero ir para a Lua.
(Livro: "Passagens e Afectos" - Tartaruga Editora)